sexta-feira, 10 de julho de 2009

Entrevista Parte Final


Confira abaixo: A entrevista do Repórter Sobre Rodas, César Paranhos, com o Desembargador da Justiça, Antonio Carlos Malheiros.

Repórter Sobre Rodas: Qual é a sua opinião sobre o depoimento da Rosana Mikowiski, do RH da Editora Três. O que a gente pode comentar sobre essa declaração?

Antonio Carlos Malheiros: A declaração é lamentável e ao mesmo tempo é honesta, porque esta senhora do RH da Editora Três, ela poderia tranqüilamente, disfarçar informações, dizer que não está lembrada, ou até inventar dados, ela foi absolutamente honesta, e senti que ela, realmente lamenta essa informação lamentável. O cumprimento da cota que é imposto a todas as empresas com mais de 100 funcionários, da contratação de funcionários, de pessoas com deficiências, eu percebo que mais uma vez, não basta a lei, a lei está aí, a lei impele para que os empresários acolham as pessoas portadoras de deficiência, e eles vão acolher, para não serem multados, não serem processados, mas acolher de que forma, de que forma eles vão acolher, eles vão acolher na marra, ou seja, vão acolher pessoas com deficiência, sem o maior critério, ou seja, sem verificar o potencial extraordinário, que uma montanha de gente com deficiência tem, aliás, conheço pessoas com deficiências muito melhores do que aqueles que se dizem normais, aliás, normal “ninguém” é na verdade e todos nós temos as nossas deficiências. Eu posso atestar que você é muito mais sadio e eficiente do que muita gente que não apresenta deficiências. Mas, voltando, vão colocar a pessoa portadora de deficiência, ou melhor a pessoa com deficiência, porque portar deficiência, a pessoa porta e “larga” a deficiência na esquina.

RSR: Ninguém leva a sua deficiência no bolso, não é verdade?

ACM: É verdade, agora de qualquer maneira, a pessoa com deficiência, com esse potencial, ela deve ser efetivamente bem aproveitada, não basta abrir as portas das empresas, só para cumprir a cota, a pessoa tem que efetivamente ser bem aproveitada, alguém com grande potencial como você, eu vejo como uma tremenda de uma injustiça, você ser recebido em um grande jornal, em uma televisão, em uma rádio, para uma “função” de segurar o fio do microfone para não cair, quando na verdade, você é um excelente radialista, você é um excelente comunicador, enfim, eu acho, que isso é realmente o princípio da isonomia, tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, e digo para você, seguindo esse princípio e a gente tentando realmente aproveitar tudo de bom que as pessoas têm, com ou sem deficiência, nós seremos grandes profissionais.

RSR: Explique para a população que não tem tanto contato com esse termo, lei de cotas. O que é essa lei de cotas e qual foi o objetivo que ela foi criada?

ACM: O objetivo é o de inclusão. Eu não considero, no momento que eu te acolho na minha empresa jornalística, você com toda a formação que você tem, para você ficar ascendendo e apagando a luz do estúdio, eu não estou incluindo você, mais uma vez, eu estou afastando você, eu estou excluindo você de um aproveitamento, de uma convivência com o restante das pessoas que muitas vezes nem aparentam e são mais “deficientes” do que você.

RSR: Na sua opinião, porque que as empresas, não só as de comunicação, mas todas, alegam ter tantas dificuldades para a contratação desses profissionais. Serão tantas dificuldades assim, ou tem alguma coisa por trás?

ACM: Eu acho que tem um bruto de um preconceito, que é aquele, como você, que tem uma deficiência, você é deficiente para tudo, esse é o grande preconceito, se “ele” se apresenta preso nessa cadeira de rodas, certamente a “cabeça dele” é presa também, “o pensamento dele” é preso, a fala dele é presa, tudo é preso, quando na verdade, a gente nota como você caminha bem e com agilidade na comunicação.

RSR: Muito obrigado pelo elogio. Você acredita que falta incentivo por parte do governo as empresas para a contratação de pessoas com deficiência?

ACM: Não. O que falta, eu volto a dizer, é falta de coragem política, falta vontade realmente de se cumprir uma função social de se ter responsabilidade social, muita gente fala que tem responsabilidade social, mais você vai “espremer”, é só enfeite, é só para ganhar cliente, que se anuncia a tal responsabilidade social quando na verdade, não se tem responsabilidade dentro da própria casa com seus funcionários e com o próprio público, muitas vezes se comete incríveis infrações ao direito dos consumidores.

RSR: Como você acha com toda sua experiência, na profissão, que os juízes, os desembargadores, com o apoio da lei, com base nessa lei de cotas, ou em outras também, poderiam “ajudar” essas pessoas com deficiência, para que elas tenham acesso com mais dignidade, eu acho que a palavra é essa, dignidade mesmo.

ACM: Eu, que sou um crítico do poder judiciário, sou crítico, porque amo o poder judiciário, eu tenho muito orgulho de ser juiz e critico efetivamente a montanha de defeitos que nós temos. Agora, nós não temos alguns defeitos, por exemplo, em julgar casos envolvendo saúde, envolvendo pessoas com deficiência, o judiciário, tem se mostrado bastante progressista, bastante adiantado no judiciário paulista, o federal também, tem se mostrado bastante solidário com essas pessoas, trazendo justiça, não é caridade não, trazendo justiça para essas pessoas, mas ainda vejo importante, muito importante o papel do judiciário, impondo a um estado ausente que cumpra com o seu dever e em relação ao mundo privado, as empresas privadas, a coisa se torna um pouco mais difusa, um pouco mais confusa.
Por que eu vou dizer que estou cumprindo as cotas, “você” judiciário, não pode me forçar que eu coloque o “Zé”, o “Pedro” ou o “Mane”, em cargo X, para o qual eles teriam plena competência. Eu prefiro, está certo, colocar um “normal” nesse cargo, e deixa a pessoa com deficiência, para funções menores, o que é um verdadeiro absurdo. A gente tem que saber sentir, com deficiência ou sem deficiência, sentir o potencial daquela pessoa. Sentindo o potencial, nós vamos verificar que realmente ela vai ter que, é cumprindo uma cota, ficar em uma função menos relevante, ou então, por maior que seja a deficiência, já entra na empresa em um patamar superior, que traga mais proveito para a própria empresa, para os consumidores e para todos que se servem da empresa e é assim que nós vamos realizando a chamada justiça social.

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